quarta-feira, março 11, 2009

Risos

"Finalmente descobri um defeito nela", disse ele, sobre a garota. "A risada, você viu que risada mais horrível ela tem?", perguntou-me.

"Pra dizer a verdade, acho que não reparei", eu disse.

É claro que havia reparado. E antes dele, talvez. Era uma gargalhada entrecortada, de alguém que parece perder o ar no meio do ato, no ápice do prazer. Era de fato incômoda e nem um pouco compatível com o sorriso que costumava ostentar quando nos cumprimentava, um riso misterioso e convidativo.

A garota era bela, não a mais chamativa, digamos assim, do lugar, mas a que conseguia despertar mais atenção pela inteligência, simpatia e, claro, pelo conjunto físico, a começar da tez clara e dos olhos claros e revoltos.

Meu amigo estava de olho nela há tempos, e me passava as impressões que obtinha ao longo do tempo: solteira, meiga, boa de conversa e um tanto insegura – o que poderia facilitar uma aproximação de alguém também inseguro, como ele. O excesso de qualidades, porém, mais parecia impedi-lo de seguir em frente e conquistá-la.

Sim, pois a paixão logo se tornaria uma idolatria que a deixava mais e mais distante dele, um rapaz também dotado de qualidades, mas tímido o suficiente para idealizar uma musa inalcançável. A mim, ao contrário, não faltava intimidade com o sexo oposto, e por mais de uma vez pensei em tomar-lhe à frente na conquista. Se não o fiz, foi porque o desejo pela garota não suplantava a amizade por ele – e até hoje nenhuma garota valeu uma traição dessa natureza. Mas não perdi a oportunidade de lhe provocar ciúmes e, quem sabe desta forma, estimular algum tipo de atitude.

Foi a partir do defeito, contudo, que ele pareceu reunir coragem para abordá-la de forma mais objetiva, digamos assim, embora as interrogações somente aumentassem.

"Acho que não conseguiria suportar ao meu lado uma mulher com uma gargalhada dessas", justificava. Se no início pareceu-me apenas mais uma desculpa para legitimar a falta de ousadia, quanto mais comentávamos sobre o inconveniente defeito, mais lhe dava razão. A ponto de eu mesmo mal conseguir me manter perto dela.

Os dois agora pouco se falam. Creio que o tempo da conquista passou para ambos. Ele me parece bem e nunca menciona o nome dela quando conversamos. Mas, não sei, algo me diz que meu amigo ainda gostaria de deixá-la rir por último.

2 comentários:

Marco disse...

Baseado em fatos reais????

Discoteca Completa disse...

Em algum momento deve ter sido, sim. Mas agora isso não conta mais. Abs.